Por Giovana Petrocele
A indústria da moda é gigante. Está entre as maiores forças inspiradoras que comandam o mundo. Não é feita apenas de luxo, glamour, colorido e design. É bem mais. É nossa vestimenta, ornamenta nossos corpos, nos protege do frio e do sol, identifica e conta um pouca da história de cada um de nós e da época que vivemos; no entanto, por ter uma “infinita” produção é, consequentemente, uma das grandes poluidoras do planeta. Infelizmente muitas marcas se tornaram violadora dos direitos humanos em grandes confecções. Para conscientizar as pessoas sobre essas questões, surgiu o movimento mundial “Fashion Revolution”, que acredita no consumo e na produção de moda responsável.

Para falar sobre “Fashion Revolution e Moda Consicente”, tema de indiscutível relevância social, conversei com a jornalista Suzana Elias, especialista no nicho da moda e representante do Fashion Revolution Brasil, em Santos (SP). Ela escreve para o blog Suzanices e é diretora da agência Suzana Comunica, que cuida da conta de várias marcas.

Moda não é supérflua e sim necessária. Porque falar sobre moda? Suzana respondeu: “Mesmo quem diz que não gosta de moda precisa se vestir, porque vivemos numa sociedade que precisamos cobrir nosso corpo e cobrimos ele com roupa, no final, todo mundo tem uma ligação com a moda”. Entenderam agora porque precisamos falar de moda e toda a sua cadeia produtiva?
A revolução da moda
Para começo de conversa, a jornalista contou sobre o surgimento do movimento global, sem fins lucrativos, chamado Fashion Revolution, representado pela The Fashion Revolution Foundation e pelo Fashion Revolution CIC, com equipes em mais de 100 países ao redor do mundo, incluindo o Brasil. Fundado por Carry Somers e Orsola de Castro, logo após o acidente no prédio Rana Plaza, em 24 de abril de 2013, em Dakha, capital de Bangladesh.
O acidente no Rana Plaza mudou a história da moda no mundo e motivou o início de uma revolução no segmento, disse Suzana. Contou que “o prédio tinha dezenas de oficinas de costura, sem estrutura e manutenção, com muitas máquinas de costura, muita eletricidade. Pegou fogo e lá morreram mais de mil pessoas e cerca de duas mil e quinhentas ficaram, com sequelas. Elas trabalhavam em oficinas para grandes marcas globais”. Após o acidente foi criado o “Conselho Global de Marcas”, por estudiosos da moda, assustados com o tamanho da tragédia e com o objetivo de fazer ações que contribuíssem, naquele primeiro momento, com aquelas pessoas que foram vítimas e, ao mesmo tempo, conscientizar outras sobre a importância de todos se questionarem e lutarem por uma indústria de moda mais justa e humanizada.
O propósito
A partir de 1990 até o acidente no Rana Plaza, em muitas confecções pelo mundo à fora havia uma espécie de esquecimento generalizado de que, atrás de cada peça de roupa confeccionada existiam seres humanos e não meras máquinas de fazer roupas, onde a preocupação era produzir mais e mais, dentro do conceito “Fast Fashion” ou moda rápida. O mundo acordou para a questão diante do desabamento do prédio em Bangladesd e em seguida nasceu o Fashion Revolution com o propósito de realizar transformações positivas na cadeia produtiva da moda, tendo como principais objetivos: conscientizar sobre os impactos socioambientais do setor; celebrar as pessoas por trás das roupas; incentivar a transparência e fomentar a sustentabilidade.

Fashion Revolution Day
O dia 24 de abril ficou marcado como o Fashion Revolution Day, que ganhou força e se tornou a Semana Fashion Revolution, momento em que ações são realizadas pelos núcleos ao redor do mundo. No Brasil acontecem debates, workshops, exibições de filmes com conteúdos para incentivar mudanças e o comportamento de consumidores, profissionais da moda e empresas.
O crescimento e fortalecimento do movimento em solo brasileiro resultou na formação do Instituto Fashion Revolution Brasil que em parceria com diversos atores da sociedade civil, terceiro setor e poder público, trabalham para alcançar mudança efetivas no setor.
Quem fez minhas roupas?
Uma das principais campanhas do movimento é a hashtag com a questão #QuemFezMinhasRoupas, cuja proposta é perguntar para as marcas que você usa, “quem fez suas roupas”? Ela convida todos a refletirem sobre o verdadeiro custo das roupas e seu impacto nas pessoas e no meio ambiente, em todas as fases do processo de produção e consumo. Incentiva as pessoas a perguntarem “Quem fez minhas roupas?” e imaginarem a cadeia produtiva do vestuário desde o agricultor que cultivou o algodão que dá origem aos tecidos, passam pelas fábricas e confecções, nas mãos dos costureiros até chegar a loja, que é o último passo de uma longa jornada que envolve centenas de pessoa. Desta maneira é mais fácil para todos entenderem o processo e o trabalho invisível por trás de cada peça de roupa que vestimos.
O Fashion Revolution quer mostrar que a mudança é possível, se todos auxiliarem na transformação social que é responsabilidade de cada um de nós. Para participar da campanha nas redes sociais, em qualquer momento do ano, é preciso fazer o seguinte:
1 – Fazer uma selfie mostrando a etiqueta da marca que está vestindo.
2 – Perguntar na legenda: @nomedamarca #QuemfezMinhasRoupas? #FashionRevolution
3 – Postar e assim fazer parte da revolução da moda!

Violação dos direitos humanos
Fashion Revolucion mobilizou para a moda responsável e que respeite o meio ambiente. “Questões sócio ambientais caminham juntas, a gente não pode separar uma coisa da outra, a gente vive no planeta terra, a gente vive neste meio ambiente”, disse Suzana, lembrando que, apesar do movimento conscientizar, ainda hoje existe bastante violações dos direitos humanos, baixa remuneração e péssimas condições de trabalho em confecções do mundo inteiro. “Muitas marcas já foram identificadas com trabalho análogo ao escravo, inclusive no Brasil”, disse a jornalista, ressaltando que a questão é muito grave.
“Quando você vai nas lojas e tem blusinha a 5 ou 10 reais, provavelmente foi um trabalho de exploração de quem confeccionou aquela peça, para chegar a um preço tão baixo, mas não é só isso, a gente pensa em moda, pensa na roupa pronta que a gente veste. Se eu quero um planeta mais sustentável, justo e consciente, não posso comprar a blusinha de 10 reais que explorou mão de obra ou foi carga roubada, que acontece demais no Brasil e no mundo”, alertou.

Poluição e lixo têxtil
A extração da matéria-prima, processos de fiação, tecelagem, beneficiamento, corte e costura, consumo e o descarte das peças de roupas geram muito lixo têxtil, tornando a moda um dos maiores poluentes do planeta. O grande consumo de água, químicos tóxicos, energia, emissões de carbono e produção de resíduos fazem parte deste cenário.
Outra questão levantada por Suzana é que, com o consumo desenfreado, contribuímos para o aumento do lixo têxtil em escala mundial. “Jogamos as roupas no lixo, antigamente duravam mais, eram desenvolvidas para durarem mais, hoje não, pois temos a questão da obsolescência da moda que muda muito rápido”, disse, ressaltando que, se cada um de nós fizer um pouquinho, ao consumir moda, sendo mais conscientes com o descarte e com o consumo, podemos ajudar a diminuir a poluição e contribuir com questões socioambientais.

O algodão que usa é sustentável?
Muita gente acha que “se está usando roupa de algodão está sendo mais ecológica porque o algodão é fibra natural, mas na verdade não está”, alertou a jornalista, explicando que “sim, o algodão é fibra natural, mas a cultura do algodão precisa de muito pesticida e depois que você planta algodão por muito tempo numa terra, ela não vai conseguir plantar mais nada”. Ela informa que existe plantação de algodão menos nociva para o solo, que é do algodão certificado, algodão cru, que pode ser tingido com corantes naturais. “Bom é comprar quantidade pequena de algodão para poucas peças e fazer uso do tingimento natural, que é muito bom para o meio ambiente e para a nossa pele”, assegurou.
Suzana disse que “a proposta do Fashion Revolution é trazer todos esses temas para a berlinda para que se consiga conscientizar o consumidor, pois a força das nossas ações cotidianas refletem no mundo ao nosso redor”.
Reflexões consciente
Vou compartilhar algumas reflexões trazidas pela Suzana, que merecem ser feitas por todos nós, que consumimos moda.
“Será que eu preciso ter quatro sapatos pretos diferentes? Mesma coisa com vestidos, blusas, etc…”
“A roupa mais sustentável e mais ecológica é aquela que já existe, se não quero mais, vou passar pra frente, alguém sempre vai querer.”
“Consumo consciente = moda consciente.”
“Só compro uma peça de roupa nova, depois que desapegar de alguma peça que tenho no meu armário.”
“Fashion Revolution é feito por pessoas e não por marcas, nem tem guia de compras de marcas.”
“Comuniquem o que fazem pelo meio ambiente.”
“Marketing verde vende uma ideia que não é real, muitas vezes, as empresas fazem o que é exigido por lei e se dizem sustentáveis.”
“Saiba de onde vem suas roupas, como foram produzidas, como a empresa trata e remunera seus funcionários.”
“Procure saber se suas roupas vem de uma empresa que abre espaço para indígenos, negros e pessoas gordas (gordofobia), principalmente falando em moda, qual imagem se associa a ela?”
“Anda falta muitas marcas para atender pessoas gordas.”
“Quando a gente cobra as marcas por atitudes inclusivas é para que tenham ações efetivas e não sejam puro marketing.”
“Temos um poder muito forte em nossas mãos, o poder do consumidor é absurdo.”
“Interessante são as lojas colaborativas, algumas reúnem pequenos grupos de artesões, outras tem armário compartilhado onde se aluga roupas para uso diário.”

A conversa com Suzana sobre o movimento Fashion Revolution e moda responsável rendeu muitas ideias e foi bem esclarecedora, tenho certeza que quanto mais pessoas envolvidas, multiplicando a causa, mais rápido seremos conscientes que a moda precisa ser revolucionária. “Com mais gente consciente, as empresar terão que parar e pensar nessas questões e mudar processos, lógico que não é da noite para o dia, é todo um processo de adaptação, que está começando agora”, finalizou. E pelo que estamos vendo, a moda só tem um único caminho, sem volta, que é da sustentabili